NI - 09.07.30 - Revisão do PDM
Tal como há 16 anos, toda a Oposição foi afastada da preparação deste documento, que condicionará a actuação do Município por mais de uma década. Só isso já justificaria a sua rejeição, mas o PS optou por se abster, mimetizando a posição tomada em 1993 pelo PSD. A CDU, mais uma vez, foi obrigada a votar contra, apresentando em Declaração de Voto (que se anexa) as razões de tal posição.
Este novo PDM acentuará uma divisão do território, privilegiando a construção no litoral e dificultando o desenvolvimento harmonioso do território mais interior, e contém cláusulas discricionárias que permitirão as mais diversas interpretações, uma espécie de urbanismo "a la carte" que compromete a sustentabilidade social e territorial do Concelho.
Resta ainda referir que, face a elementos dissonantes que ainda subsistem - como a contradição com outros instrumentos de ordenamento urbanístico em vigor - afigura-se que o historial desta revisão não terminou hoje, e conhecerá novos capítulos.
Os gaienses sabem que poderão contar com a mais firme vigilância e esforços da CDU no sentido de minorar os danos que este Plano pode causar e apresentar alternativas conducentes a uma Gaia mais justa, mais democrática e mais sustentada.
CDU/Gaia
Gabinete de Imprensa
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Declaração de Voto
Em nota prévia, cabe aqui uma palavra de apreço aos técnicos que elaboraram os documentos que vamos apreciar, na sua parte técnica, e que de modo algum podem ser responsabilizados pelas opções políticas que os enformaram.
1. A matéria hoje em votação carece de um resumo histórico que se passa a enunciar.
A elaboração do primeiro PDM iniciou-se nos finais dos anos oitenta, com a participação de todas as forças partidárias, num esforço concertado de reunir consensos sobre um instrumento de planeamento a que todos reconheciam a maior importância.
Este processo sofreu um forte revés com a maioria absoluta obtida pelo PS em 1989. A partir desse momento, o PDM passou a ser elaborado com grande secretismo, e o documento final para votação foi apresentado à Câmara, já no fim do mandato, com escasso tempo para apreciação, motivo pelo qual a CDU se absteve na votação, denunciando o secretismo e falta de participação havido, bem como o facto de terem sido criadas situações de facto que efectivamente condicionaram irremediavelmente o conteúdo do PDM. Registe-se que o PSD votou favoravelmente a proposta.
Posteriormente, e com maior tempo para apreciação da proposta, na Assembleia Municipal a CDU votou contra a proposta, que viria a ser aprovada exclusivamente pelo PS, já que o PSD se absteve.
Posteriormente, a ratificação governamental viria a amputar parte do Regulamento, e, apesar de múltiplos esforços da CDU para que as consequências desse corte fossem devidamente analisadas e ponderadas nunca encontrou eco por parte do PS na sua segunda maioria absoluta.
Pode assim dizer-se que o primeiro PDM nasceu torto; e, como tal, nunca se endireitou, apesar das múltiplas “próteses” (leia-se: suspensões, Planos de Pormenor, e Planos de Urbanização) com que se tentou “encaixá-lo” na realidade gaiense.
2. Em 1998, no início do seu primeiro mandato, a actual maioria PSD/CDS anunciou como sua “prioridade absoluta” a Revisão do PDM. Porém demoraria ainda 3 anos a deliberar dar início ao respectivo processo, em 2001.
Voltou a registar-se um profundo secretismo na elaboração da proposta, pois as decisões políticas nunca foram apreciadas nos órgãos municipais.
O senhor Presidente da Câmara apresentou publicamente o planeamento da revisão em 5 de Novembro de 2004, em acto público no Auditório Municipal, anunciando então que estaria pronta "até Julho de 2005", prazo que, a ser cumprido, representaria um aceitável atraso de apenas um ano sobre os prazos previstos legalmente.
Mas só em Julho de 2007 foi apresentada e votada em Câmara uma primeira proposta provisória de Revisão, contra a qual a CDU votou, denunciando que o atraso verificado foi permitindo a criação de situações de facto que condicionaram a Revisão e diminuíram as alternativas.
A escassa participação no período reservado à discussão pública, em que se registou, essencialmente, um conjunto de pedidos individuais de legalização de situações e/ou o alargamento de possibilidades construtivas, num exercício formal de participação que, efectivamente, não contribuiu para a apreciação pública das consequências globais desta Proposta.
3. A actual maioria PSD/CDS comete exactamente os mesmos “pecados” cometidos pela Vereação maioritária PS aquando da aprovação do primeiro PDM: impediu a participação de outras forças partidárias na elaboração de um documento que, por se destinar à gestão do Concelho durante um período bastante alargado, deveria reunir o máximo de consenso possível; criou situações que só poderão ser ultrapassadas por incumprimento ou por alteração profunda e desvirtuação das intenções anunciadas, por muito louváveis que possam ser.
Importa recordar que a actual maioria procurou, ilegalmente, alterar a Carta da REN para permitir a implantação de projectos imobiliários; que criou instrumentos de planeamento urbanístico visando alterar disposições essenciais do anterior PDM; que aprovou projectos de elevado impacto, como é o caso da Urbanização da Barrosa, ou as diversas formulações para a Quinta Marques Gomes, que condicionaram irreversivelmente a revisão; e que, apesar de não ter desenvolvido os esforços que se impunham para resolver situações de construções clandestinas que surgiram de necessidades e carências objectivas, de que é exemplo o caso da Escarpa da Serra do Pilar, se dispôs, por outro lado, a beneficiar interesses económicos e a alterar o PDM (e até a sua Revisão) para dar resposta a solicitações menos merecedoras de consideração.
Ao longo do tempo, foram sendo lançadas e abandonadas ideias, como a da multiplicação de campos de golfe, que mais não foram do que meros veículos de auto-promoção.
É caso para dizer que esta maioria, mais uma vez, se fez forte com os fracos, e fraca com os fortes.
4. A CDU, logo desde 2002, tentou que se realizasse um debate sério sobre o PDM e sobre a sua revisão, mas a maioria nunca aceitou qualquer das suas propostas, nomeadamente de apreciação, na Assembleia Municipal, de todo o processo.
Aliás, logo após a não-ratificação governamental de alguns aspectos do Regulamento do PDM de 1993, a CDU propôs que se fizesse um estudo sobre as implicações desse facto no documento, mas tal nunca foi feito.
Em 12 de Dezembro de 1994 a CMG aprovou por unanimidade uma proposta do PSD que previa que fosse feita uma informação acerca das implicações da não ratificação de normas do Regulamento do PDM. Nunca foi feita.
Em 10 de Março de 1997 a Câmara aprovou por unanimidade uma proposta da CDU para iniciar um estudo de revisão do PDM face ao Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) e às insuficiências do PDM devido à não ratificação total. Nunca foi feito.
Existem referências, nomeadamente em acções inspectivas, de que o PDM foi desrespeitado repetidamente, e que foi feita “letra morta” da resolução de ratificação governamental que excluíra algumas normas.
Entretanto, o PDM ainda em vigor tem sofrido suspensões (ou tentativas disso) pontuais. Vejamos alguns exemplos:
• Em 1997, para edificação do aterro sanitário em Sermonde
• Em 2000, para tentativa de alteração pontual na orla costeira
• Em 2001, para questões ligadas ao Centro de Estágio Olival/Crestuma
• Em 2002, para a zona da Telheira
• Em 2003, há uma nova tentativa de alteração da REN na zona do Centro de Estágio Olival/Crestuma, alegando-se “meros ajustes técnicos”; depois de intervenção da CDU, que denunciou a tentativa de alteração ilegal da Carta REN, a questão foi adiada por “uma semana”, mas nunca voltou a ser apreciada
• Em 2004, de novo para a zona do Centro de Estágio Olival/Crestuma
• Em 2004, foi pedida suspensão na zona Polis
• Em 2005, de novo para a zona POLIS, sendo expressamente invocada urgência para que o último Conselho de Ministros antes das eleições desse ano ratificasse a suspensão - o que não veio a acontecer, felizmente, caso contrário o plano da ESAF (Espírito Santo Activos Financeiros, do grupo BES), para a Quinta Marques Gomes teria avançado à vontade
• Em 2005, registou-se uma alteração da zona da Reserva Ecológica Nacional (REN) em Lever, pela via da declaração de utilidade pública, alegadamente por causa da ETAR de Lever
• Em 2006, nova alteração, para possibilitar a edificação do “Media Parque” no Monte da Virgem e de um Hotel de luxo no Centro Histórico
Em Maio do ano passado, finalmente, a maioria aceitou a criação de uma Comissão Eventual para acompanhamento do processo. A CDU absteve-se quanto a essa proposta, e está à vista a razão que lhe assistia: tal Comissão não chegou a reunir-se.
Tratou-se assim e apenas de mais uma manobra de promoção propagandística, sem qualquer intenção real de discussão, como então denunciamos.
5. As peripécias que rodearam esta última fase do processo não podem deixar de ser referidas.
Depois de um atraso de 5 anos, ocorreu uma súbita pressa de aprovar o documento, pelo que em 1 de Junho passado, inopinadamente e enquanto decorria a campanha eleitoral para o Parlamento Europeu, foi convocada uma reunião pública com a antecedência mínima – dois dias úteis – para aprovação em Câmara da proposta final.
Passadas duas semanas, a proposta regressou à Câmara por terem sido detectados erros. Depois, foi a vez de a CCDR-N colocar questões de relevante importância, que constam no seu ofício de 8 de Julho passado, algumas das quais se mantiveram mesmo depois de uma reunião técnica de urgência em que foram negociadas mais alterações. E é assim que o Parecer Final da CCDR-N, de 15 de Julho, mantém reservas e refere que a proposta de revisão apresenta problemas de discricionariedade de que igualmente enfermava o projecto de 1993, o que posteriormente viria a motivar cortes na ratificação governamental cujos efeitos nunca foram devidamente ponderados, apesar das muitas insistências da CDU nessa matéria.
A Câmara, em há poucos dias atrás, aprovou finalmente – apenas com o voto contra da CDU – a proposta que hoje apreciamos.
Caberá aqui perguntar se, depois de tanto atraso e a pouco tempo de eleições autárquicas e legislativas, será adequado forçar a aprovação desta proposta de Revisão que, pelo seu impacto no território e nas acções de futuros executivos, deveria merecer um mais amplo consenso.
6. Assim, continuamos a constatar que não houve qualquer debate alargado sobre o processo, e também que esta proposta apresenta orientações e articulados de que discordamos, pois tem subjacente um tipo de crescimento dual, concentrando mais construções no que já é urbano, à custa da diminuição das zonas verdes (RAN e REN), e à limitação do desenvolvimento urbano no interior do Concelho, criando-se um desequilíbrio entre o litoral e o interior que terá inevitáveis custos no desenvolvimento de algumas Freguesias.
Esta Revisão levanta ainda preocupações quanto à preservação das áreas REN e RAN, outras zonas verdes e à expansão desenfreada da área e dos índices de edificação, já hoje muito elevados, assim procurando afeiçoar-se aos interesses imobiliários dominantes. Aposta num modelo de desenvolvimento que não responde às grandes carências sociais, e não houve empenho na participação da população.
A CDU, tal como em 1993, e lamentavelmente, volta a não ter qualquer alternativa senão votar contra um PDM que, no futuro, se mostrará incapaz de dar resposta às necessidades do Concelho, abre caminho à discricionariedade, e transporta em si mesmo as condições necessárias para a sua própria desvirtuação, “pecados” que igualmente marcaram o PDM de 1993.